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quarta-feira, 30 de novembro de 2016

ESCOLHEU MEU NOME O DESTINO ( ODE À LIBERDADE )

Voce vem ao mundo e, sem que perceba, ja lhe tem adotado um nome.  Que, obviamente, não escolheu, fruto das fantasias e delirios dos seus pais.
De onde surgiu a necessidade de caracterizar a prole ?  Para diferenciar um individuo do outro, provavelmente.  O grande problema é que, junto a essa urgencia prática, surgiram também os desejos egoistas da escolha individual.  Sendo assim, eles se tornaram soberanos e imutáveis.
Nascemos com um nome, em que a maioria absoluta dos cidadãos ocidentais não pensará em questionar, seja esse seu desejo ou não.
Por uma questão de tradição, a geração judaica mais antiga continuava a perpetuação nominal de parentes que haviam se ido.  Tornei-me Anabela.  Homenagem à minha avó e tia, um nome multiplicado em suas emoções e homenagens.
Primeiramente, não gosto de nomes longos, e muito menos adjetivados.  É claro que, aos olhos de crianças que sabem ser pérfidas, me tornei oposto, sabendo eu ser ou não bonita.  E cômico e truculento se alcunhar uma menina por Anafeia, mas muito prazeroso.  Vejo cada rosto saboreando a emoção do contrafeito, principalmente em não havendo uma resposta em revide.
Calei-me, e me lembro de que esse foi um dos derradeiros traumas de minha total existencia. Carregar um nome de mortas, que eu não conheci, estimei, e que me trouxeram só estigma.  Mas, sozinha, frente a um exercito de alcunhadores, me curvei a minha propria impotencia.
Minha redenção ocorreu depois de quase trinta anos, quando fui morar num pais diferente em que, nem ao menos, as letras do alfabeto coincidem.  Para minha surpresa e satisfação, encontrei menos letras no meu nome em hebraico, grande vitoria.
Mas meu verdadeiro regozigo está no devaneio melódico que meu nome parece causar. Sou notificada de que ele soa cristalino aos ouvidos, e semblantes, quase sempre extasiados, me parabenizaram como se houvera essa sido minha escolha pessoal.  Onde moro não há sentido em se procurar um significado, posto que a sonoridade em tudo se atravessa ao motivo.
Vivo feliz, submersa ao desejo de me esconder de um trauma, que meu já não mais é.  Venci, como se tivesse empunhado armas, não soubera eu as havia tido.  Tenho um nome lindo e, sem querer, se fez justiça.
Penso comigo, e muito, no sentido das escolhas que por mim foram feitas. O absurdo de carregar uma dor que não é minha, por tanto tempo.
Do mesmo modo que a adjetivação prejudica a crítica objetiva de fatos, pode marcar um nome por toda a vida, pregar em ferro e brasa a auto estima de uma criança que, por fim, se tornará adulta.
Aos pais o desejo prerremptório de se fazerem presentes em suas vontades.  A nós, descendentes, a humildade da resignação.
Nomes deveriam tramitar, e serem sujeitos à vontade de quem os recebe, desde a mais tenra infancia.  Deveriam voar ao vento, e encontrarem seus ninhos justos.  Na verdade, muito me alegraria ser chamada por menina.  Aquela que lá vai, olha, e se identifica.
E que, num dia, surpresa, mas deliciada, lhe fosse dada a graça de optar.  A qual, provalmente, pediria postergar o pedido.  Ou mais, simplesmente, como toda a criança, rebateria com a palavra doce.
Não seria um nome comum e, eventualmente, escolheria outro.  Que me desse prazer, recompensa e sentido.
Nem todas as Anabelas encontrarão uma segunda chance.  Para as que ficaram, a renuncia.  Ou se adaptaram às circunstancias, ou não sofreram, como eu. Quiçá ainda acrescentariam mais letras, como na lingua inglesa.
Eu me livrei do destino, abrindo outra página em minha trajetoria.  Como se minha decisão de partir quisera ser meu aval a um verdadeiro novo começo.  A possibilidade de viver meu nome, em liberdade, foi uma das garantias de que tomei o rumo certo.  E de que as diferentes linguas, espalhadas pelo mundo, encontraram coerencia em sua razao de ser.
Aqui estou, por decisão de uma sorte existencial, convicta de que, a cada vez que emitir os sons de Anabela, receberei um elogio em troca.  Mais importante, não viverei o mundo da chacota que, em criança, um dia experienciei.
A todos que, como eu, experimentaram a desilusão da não escolha, já em idade tão precoce.  Que temeram calados e sozinhos, minha empatia.   Meu desejo de que sejamos livres, alcunhas e sílabas a nos perseguir.
Antes de tudo, seres humanos com direito a sua individualidade e decisões.  De resto, a vida, por si só, tomará conta.                                                                                                                                  

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